56 - Por que os alimentos orgânicos são mais caros?

DAROLT, Moacir Roberto
Engenheiro Agrônomo, Doutor em Meio Ambiente, Pesquisador do Instituto Agronômico do Paraná (IAPAR), Ponta Grossa, C.Postal 129, CEP 84001-970, Fone/Fax: (42) 229-2829. E-mail:
darolt@pr.gov.br

Trabalho publicado em 15/06/2001

 

O preço dos alimentos orgânicos pode ser considerado como um dos entraves para um rápido desenvolvimento da produção orgânica no Brasil. Além disso, é um ponto bastante polêmico quando pensamos em um sistema sustentável que atenda os requisitos de igualdade na distribuição de alimentos de maior valor biológico para maioria da população. Neste sentido, este artigo faz uma análise tentando mostrar que o relativo aumento de preço dos produtos orgânicos está ligado a um conjunto de fatores que podem ser equacionados no médio prazo, levando a uma diminuição da diferença de preços entre orgânicos e convencionais.

Um trabalho realizado na Europa por SYLVANDER (1998), mostrou que a diferença de preços entre orgânicos e convencionais vem baixando. Em 1986, os alimentos orgânicos eram entre 35 e 50% mais caros que os similares convencionais, já em 1997 esta diferença baixou para cerca de 30%. Para LAMPKIN & PADEL (1994) os preços mais elevados dos produtos orgânicos são essenciais para que o produtor orgânico consiga uma renda final similar aos produtores convencionais.

No Brasil, no estágio atual da agricultura orgânica, o que viabiliza economicamente os sistemas orgânicos é o preço obtido na venda dos produtos em mercados diferenciados. Segundo CARMO & MAGALHÃES (1999), a agricultura orgânica tem se apresentado muito mais como uma eficiência de mercado do que uma eficiência técnica (volumes, diversidade e constância de produção).

Para entendermos a questão do preço procuramos acompanhar o processo desde a produção até a comercialização. A figura 1, mostra que o preço final ao consumidor costuma variar conforme o local de compra e o tipo de produto adquirido. Por exemplo, quando a venda é realizada de forma direta, como no caso das feiras verdes, não existe grande diferença entre o preço do produto orgânico e do convencional, sobretudo quando se trata de hortaliças de folhas. Esse fato foi confirmado por uma pesquisa de opinião pública que realizamos, comparando diversos aspectos entre as feiras do município de Curitiba, entre eles os preços. Os resultados mostraram que os consumidores avaliaram como "bom" o preço da feira orgânica, com respostas semelhantes para a feira convencional. Já nas redes de supermercados, os preços são em média 30% mais caros, podendo chegar a diferenças superiores a 100%, em produtos como o tomate e a batata.

FIGURA 1 - CANAIS E MARGENS DE COMERCIALIZAÇÃO DE PRODUTOS ORGÂNICOS

FONTE: DAROLT (2000)
NOTA: Para análise das percentagens médias recebidas pelo agricultor, associação/empresa e supermercados, foram avaliados cerca de 40 produtos orgânicos.
(1)Percentagem média recebida do valor final pago pelo consumidor.
(2)Valor percentual adicionado ao preço do produto recebido, para cobrir os custos de comercialização e retirar a margem de lucro.

Acompanhando cerca de 40 produtos orgânicos, comercializados basicamente via supermercado, observamos que do valor total (100%) deixado no caixa pelo consumidor, em média 30% são destinados ao agricultor, 33 % são para cobrir os custos dos distribuidores com classificação, embalagem, transporte e pessoal, e o restante (37%) corresponde à margem dos supermercados. Cabe destacar que os descartes dos supermercados são assumidos integralmente pelos distribuidores (associações e empresas), o que aumenta a margem dos supermercados e encarece demasiadamente o produto final para o consumidor.

O que chama atenção é que para comercializar via supermercado existe a necessidade de diferenciar os alimentos orgânicos dos convencionais e isso é feito por meio de uma embalagem especial. Em nossa pesquisa observamos que a embalagem custava R$ 0,07 e a mão-de-obra R$ 0,08, fator que encarecia o produto em R$ 0,15/ unidade embalada. Segundo nossa pesquisa (DAROLT, 2000) este preço deveria baixar para algo em torno de R$ 0,05/embalagem, porém isto depende do aumento de escala de produção.

(OBSV:A embalagem é de isopor coberta por um filme plástico, o que gera certa contradição quando se trata de um alimento produzido de forma "ecologicamente correta". Apesar de alguns estudos para o desenvolvimento de bandejas à base de amido de mandioca, ainda não há no mercado uma embalagem que substitua a bandeja de isopor em eficiência e preço)

A baixa escala de produção orgânica, implica maiores custos (mão-de-obra; insumos) por unidade de produto, o que se reflete no relativo aumento de preços. As estratégias devem ser direcionadas no sentido de atingir um ponto de equilíbrio e estabelecer uma escala de produção que possibilite reduzir os custos e aumentar o valor pago ao agricultor.

Além dos baixos volumes constatamos que a produção orgânica tem uma queda mais acentuada nos meses de inverno. Os problemas relacionados com a sazonalidade de produção nos meses de inverno, sobretudo no Sul e Sudeste do Brasil, podem causar diminuição de até 50% no faturamento das empresas e, conseqüente, aumento do preço final do produto.

Por ser um sistema novo, ainda há uma desorganização do sistema de produção (falta de planejamento) e do processo de comercialização. A descontinuidade de produção é reflexo da falta de um bom planejamento que possibilite facilitar a tomada de decisão no momento da comercialização. A dificuldade de seguir um planejamento de produção está relacionada a um conjunto de fatores como a falta de organização dos pequenos agricultores (responsáveis por 70% da produção orgânica nacional), a falta de treinamento na área gerencial, a falta de estrutura para lidar com o clima e o desconhecimento técnico-agronômico. Além disso, a logística e distribuição também são dificuldades a serem superadas. Portanto, estes pontos devem ser equacionados para se atingir um bom planejamento de produção, que permita diminuir o preço final do produto.

Outro ponto que encarece o produto final é a falta ou o pequeno número de pesquisas na área orgânica. Essa situação faz com que o agricultor tenha que fazer seus próprios experimentos, aumentando os riscos de perdas na produção.

Por último, os preços são maiores devido a custos extras com o processo de certificação e perdas econômicas durante o processo de conversão que são internalizados pelo produtor.

Para sintetizar a questão do preço, podemos dizer que o aumento relativo dos alimentos orgânicos está relacionado ao local de compra, tipo de produto e outros fatores relacionados ao processo de produção. O mais geral é a baixa escala de produção orgânica, o que implica maiores custos (mão-de-obra; insumos) por unidade de produto. Além disso, temos o problema do custo da embalagem para diferenciar produto orgânico do convencional, sobretudo em supermercados. Em seguida, há uma desorganização do sistema de produção (falta de planejamento) e do processo de comercialização. Depois, em função da falta de pesquisa, existem maiores riscos e a necessidade de experimentação do agricultor. Por último, os preços são maiores devido a custos adicionais com o processo de certificação e perdas econômicas durante o processo de conversão.

No estágio inicial em que se encontra a produção orgânica, o preço diferenciado muitas vezes compensa os rendimentos inferiores e o custo da mão-de-obra, contribuindo para que o produtor orgânico obtenha margens brutas por hectare e rendas idênticas aos produtores convencionais.

Entretanto, vale lembrar que o sistema só será sustentável se os preços forem competitivos com o sistema convencional, apesar de os consumidores ainda estarem dispostos a pagar até 30% a mais por um produto orgânico. Todavia, a tendência é que haja uma redução de preços para o futuro, o que seria importante para que a maioria da população tenha acesso a produtos "limpos", pois a eqüidade é uma característica fundamental quando pensamos na sustentabilidade.

É fundamental reforçar que a concorrência econômica entre o sistema orgânico e o convencional é injusta, pois a agricultura convencional exclui dos cálculos da formação de preço a contabilidade ambiental, exteriorizando os impactos ambientais, ao passo que a agricultura orgânica interioriza esses custos. Além disso, o produtor orgânico sofre uma pressão enorme de todo sistema agrícola que é guiado pela lógica convencional.

Finalmente, para que os preços dos alimentos orgânicos sejam competitivos, é fundamental que os diferentes "nós da rede" envolvidos com a produção orgânica, comecem a conversar. Com isso queremos dizer que os produtores, transformadores, processadores, distribuidores e consumidores, devem formar uma rede de interesses comuns no intuito de atender as necessidades de cada ator e desenvolver uma filosofia de agricultura orgânica coerente com os preceitos da sustentabilidade.

REFERÊNCIAS CITADAS

CARMO, M. S. do; MAGALHÃES, M.M. de. Agricultura sustentável: avaliação da eficiência técnica e econômica de atividades agropecuárias selecionadas no sistema não convencional de produção. Informações Econômicas, São Paulo: IEA, v. 29, n. 7, p. 7-98, jul. 1999.

DAROLT, M.R. As Dimensões da Sustentabilidade: Um estudo da agricultura orgânica na região metropolitana de Curitiba-PR. Curitiba, 2000. Tese de Doutorado em Meio Ambiente e Desenvolvimento, Universidade Federal do Paraná/ParisVII. 310 p.

LAMPKIN, N.H. & PADEL, S (ed.). The Economics of Organic Farming: an international perspective. Wallingford, UK: Cab International. 468 p. 1994.

SYLVANDER, B. Le marché des produits biologiques et la demande. INRA-UREQUA, Le Mans, 27 p. 1998.

 

Fonte: https://www.planetaorganico.com.br

Acessado em 29/10/2011

 


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